quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Precisamos falar (bem) dos nossos exs.


No café filosófico denominado “Adeus as ilusões (está na íntegra no youtube) Renato Janine nos explica as razões da paixão estar fadada ao fracasso depois de um tempo: no ocidente entramos em relacionamentos movidos pela paixão que estamos sentindo, a flor da pele, com o sentimento em uma calibragem de cem por cento – coisa que não pode se manter por muito tempo mas que vai orientar as direções de nossos afetos e a maneira como lidaremos com eles daqui pra frente. Se depois de um ano ou dois meu afeto e satisfação dentro da relação estiver em cinquenta por cento, provavelmente estarei frustradíssima com essa diminuição que se sucedeu sendo possível que eu vá embora atrás de viver aquelas sensações novamente (em oposição a cultura oriental na qual muitas relações são arranjadas e por isso iniciam-se com 0% de investimento, vindo qualquer crescimento posterior a medida que o outro se desvela a ser lucro dentro da parceria).

Quando estamos no modo cem por cento é fácil acordar cedo para levar o outro no trabalho, dormir tarde para assistir aquele filme que nem nos interessa tanto assim, tomar uma cerveja em plena terça-feira, desmarcar com os amigos ou gastar, feliz da vida, um baita dinheiro em um presente para o amado. Entrar na vida do outro é lindo. É tudo descoberta, tudo nele parece agradável, quer se ser especial, quer se fazer diferença, toda a sede do deserto quer sorver o gole de uma vez só. Ser o estrangeiro que chega é fácil. Ser o mistério sensual que nos sorri, nos convida e nos manda uma mensagem no meio da tarde dizendo “saudade” é easy mode, café pequeno, comum. Mas como é que você se saí nas despedidas ? Mas quando essa porcentagem se diminui ou esgota – o que fica? Será que a toa que o estereótipo é que ex-namorados só falam mal uns dos outros?

Talvez eu tenha sorte, talvez eu tenha feito por onde, talvez eu tenha um dedo bom para escolher os homens que deixo me acompanharem ao longo da caminhada. Meu último namorado foi uma das pessoas que mais me deu força para começar esse blog, me enchendo e empurrando de elogios até eu criar coragem e me aturando tirar mil dúvidas de ordem técnica – e já tínhamos terminado o namoro. Meu penúltimo namorado lendo um dos textos sobre como as pessoas estão loucas e se perdendo por pouco me mandou uma mensagem linda dizendo que esperava que eu continuasse sabendo ver sutilezas e extrair coisas boas da vida em um nível não superficial, que eu continuasse não me deslumbrando com as superficialidades e que não seria desafiante para mim me manter fiel ao que eu gosto. Imagina, você tá no ápice da desilusão com os rumos do mundo e da humanidade e uma pessoa que te conhece tão bem (todos os seus defeitos inclusos, após 900 dias de convivência intensa) tem palavras tão bonitas e carinhosas para te dizer?

Em sua canção “Caminhos do coração” Gonzaguinha diz “E aprendi que se depende sempre/ De tanta, muita, diferente gente /Toda pessoa sempre é as marcas /Das lições diárias de outras tantas pessoas”. Então sim, provavelmente a ex do seu namorado, da qual você morre de ciúme foi muito importante para ele aprender várias coisas. Talvez a ouvir. Talvez a falar. Talvez a pedir desculpas. E sim, algo dela vai ficar no repertório dele. Como eu não vou esquecer que dei meu primeiro beijo num halloween do curso de inglês, de como enfim conheci o menino mais bonito do terceiro ano num chat de msn via amiga em comum, de receber cartas com desenhos de gérberas, de transformar o melhor amigo de anos em namorado, de ser cara de pau tomar a iniciativa de chamar alguém pra tomar um picolé ou de demorar cinco encontros pra aceitar receber um beijo. Que a memória perpetue tudo que for a gente deixando as pessoas nos estimularem a ser o melhor que pudermos ser (e que as brigas prescrevam, como crimes antigos que de fato são) – o namorado que estimulou a minha independência, o que me fazia procurar escrever as coisas mais bonitas, o que dizia que admirava o jeito especial com que eu tratava as pessoas, o que me fez encarar a dureza da vida e ver o quanto eu podia ser forte, o que pediu que eu abaixasse os muros para que ele pudesse chegar perto de mim.

“E é tão bonito quando a gente entende /Que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá /E é tão bonito quando a gente sente / Que nunca está sozinho por mais que pense estar” E eu entendo, Gonzaguinha. E agradeço.

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