sábado, 21 de novembro de 2015

Você, você


Já deviam ser umas duas da manhã e eu estava completamente corcunda, debruçada com os cotovelos apoiados na mesinha perto do palco a fim de equilibrar o peso que meus pés não aguentavam mais carregar depois de tanto dançar. Você encostou em mim tão sutil que eu nem percebi e me perguntou: por que você não está dançando? Eu fui sincera: é impossível dançar com esses sapatos. – E por que você não tira? – Elas (apontei para as minhas amigas) disseram que mulher sem sapato na balada é o equivalente a homem sem camisa. Você gargalhou gostoso e disse que não se importava nem um pouco se eu tirasse os sapatos – mesmo você tendo uns quase dois metros de altura. E ficou ali no meio da música falando comigo sobre fazer terapia, a difícil situação do Bahia, o engarrafamento da cidade. E disse que eu era muito antipática de nem ficar reta para conversar com você, mas não foi embora! Encostou os seus cotovelos na mesinha e ficou ainda mais corcunda do que eu.

Muito depois você perguntou a minha idade e ficou muito vermelho quando eu disse ter vinte e sete. “Não parece de jeito nenhum!!!”. Eu ri muito de você ser tão novo e ter chegado em mim achando que eu também era – ri satisfeita me sentindo alguns anos mais nova. Você ficou ali gastando assunto até eu ir embora – sem tentar nada comigo - e quando eu cheguei no carro já tinha uma mensagem no meu whatsapp me perguntando como eu podia ser ainda mais bonita de óculos.

Em outro momento eu tive a chance de te perguntar o que levava uma pessoa sóbria a ir paquerar a pessoa mais desanimada da balada e você me disse que era um misto de desafio com a sensação de que eu era diferente – que você confirmou depois quando teve seu primeiro papo de futebol com uma garota em uma festa ou quando teve o seu papo mais comprido sem ficar com a garota em questão. E eu pude te confidenciar que naquele dia eu estava zero disponível, mas você foi tão suave e disposto a conversar ( e eu já gosto de um pé de prosa) que não te mandei embora. Parecia que você me conhecia de alguma forma.

Você pôde descobrir que eu não era corcunda e que parecia ainda mais nova com cara de “cotidiano”. E pôde rir de todas as minhas piadas ruins que eu achava muito boas e de quando eu chorei no cinema ou te obriguei a escutar o cd de Fábio Jr. E começou a dormir menos para ter mais tempo de fazermos alguma coisa juntos. E brigou feio comigo todas as vezes que me achava “racional demais” e eu achava que você nunca mais ia aparecer e lá vinha você de volta sendo um jovem muito mais corajoso, maduro e disponível do que eu esperava e você ria e dizia que não tinha condições, eu tinha um sorriso bonito demais, era impossível lutar contra isso e que bom, o beijo também não era nada mal e o mundo andava difícil lá fora. E começavam mil discussões de relação. E pedidos de desculpa. E pedidos de “fica”. E eu só podia te abraçar por ficar – por reconhecer que ficar era difícil ás vezes, mas que era o que você queria e o que eu queria também e isso era mais importante do que tudo. E quando eu tinha um dia ruim você sempre tinha uma massagem boa. E eu adorei todas as vezes que você disse que eu era foda – ou como elogio ou porque eu te deixava louco.

Um dia você confessou o ciúmes que sentia de eu escrever tanto e não escrever nada pra você. Pra você, não sei. Mas sobre você? Tem gente que faz a gente sentir que devolveram um tempo que nos tinha sido roubado. Tem gente que nos rouba e gente que nos devolve. Você é dessas gentes, você.

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