Filmes que tem diálogos bonitos
costumam me marcar a ponto de eu conseguir decorar uma coisa ou outra neles.
Adoro a parte do "Segredo dos seus olhos" em que Sandoval fala que
você pode mudar de nome, cidade, aparência, mas não pode mudar de paixão. Gosto
quando Clementine fala pra Joel, em Brilho eterno de uma mente sem lembrança,
que ela não é um conceito, é só uma garota tentando se encontrar. Em "Meia
noite em Paris" tem uma parte especialmente boa em que Hemingway diz, em
tradução livre: "toda covardia vem de não amar ou não amar bem, que são
basicamente a mesma coisa". Lembro que saí do cinema com essa frase na
cabeça e até hoje entendo a razão.
Todo mundo tem suas covardias,
pequenas e grandes. Toda folha em branco antes de ser texto me convida a ser
covarde e nem começar a escrita. Todo rapaz que se aproxima me convida a ser
covarde e nem pagar pra ver no que vai dar. Hoje estou especialmente covarde
frente a uma apresentação que precisa ser feita para que eu pegue o tão famoso
diploma. Toda covardia é um convite a não-ser. É o contrário da ação, o
paradeiro do pensamento que conduz a inércia. A covardia preenche meus
sentimentos quando penso em me formar e encarar um mercado de trabalho em um
momento tão delicado da economia do país. Talvez por isso a frase do Hemingway
tenha surgido na minha mente.
Talvez tenha surgido antes, quando uma
amiga comentou que estava tentando ter um dia dos namorados legal com o
paquerinha mas que ela sentia que ele estava em fuga. Bom, como eles se veem
sempre e já tem algum tempo eu disse a ela que suspeitava que fosse um caso
clássico de "medo do nome" (confesso: adoro batizar as coisas), em
que ele deveria supor que se eles tivessem um encontro no dia dos namorados
automaticamente ele seria convertido em, oh, que sina terrível, que destino de
tragédia, namorado dela. Não adiantava ela gastar saliva tentando me explicar
que não era uma tentativa de pressionar o rapaz a assumir nada porque eu não
era o rapaz em questão, ora. Entendo o medo dele, é como se a data o conduzisse
por obrigação a assumir um lugar que talvez ele não queira. O nome
"ficante" não carrega muitas obrigações, nas costas do nome "namorado"
costumamos depositar bem mais expectativas. Entendo a frustração dela - se
gostam um do outro (e ela espera que gostem, e eu também, porque senão
convenhamos, ela está perdendo de ser gostada por alguém enquanto sai com quem
não gosta dela...) e se veem toda semana, porque não podem passar uma data que
celebra o gostar fazendo algo legal?
Talvez seja o mesmo
cá comigo. Já foram vários semestres. Já foram vários trabalhos. Várias horas
de estágio. Não tem porque esse último trabalho ser pior do que nenhum outro.
Exceto pelo seu nome. Racionalmente eu tive que subir toda a escada até chegar
no diploma e não só esse último degrau. Mas estando tão perto da porta não
consigo negar: o último degrau me apavora, porque depois dele só resta a porta
que muda tudo, que tira as coisas dos lugares que eu já conheço, de todas as
maneiras possíveis. Entendo a minha própria ansiedade frente ao que não controlo. O medo talvez cegue a racionalidade e aí a covardia
paralise todo o resto.
Prezado T., não te
conheço, mas caso você goste da minha amiga, convide-a para sair, ela não vai
se sentir convidada a namorar com você, juro, só vai achar que de algum modo
ela significa algo pra você. (Atenção galera que esteja na mesma situação, pode
mandar esse texto assim, como quem não quer nada, pros ditos cujos,
recomendando tipo "olha só esse texto, achei tão legal, dá uma
lida...". De nada, adoro ser útil.) Prezada Juliana, chega de elocubrar
sobre a covardia, foi ótimo poder alinhar seus pensamentos sobre o tema e se
acalmar, agora vamos efetivamente encarar o relatório?
Toda covardia vem de
não amar ou não amar bem, que são basicamente a mesma coisa. Tô lembrando.
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